Baseado em A Survey of Bible Doctrine, de Charles C.
Ryrie.
A questão de quais livros pertencem à Bíblia é chamada
de questão canônica. A palavra cânon significa régua,
vara de medir, regra, e, em relação à Bíblia,
refere-se à coleção de livros que passaram pelo teste
de autenticidade e autoridade. Significa ainda que
esses livros são nossa regra de fé e vida. Mas, como
foi formada esta coleção, adequadamente chamada de
Bíblia?
· Os Testes de Canonicidade
Em primeiro lugar é importante lembrarmos que certos
livros já eram canônicos antes de qualquer teste lhes
ser aplicado. Isto é como dizer que alguns alunos são
inteligentes antes mesmo de se aplicar neles qualquer
prova. Os testes apenas provam aquilo que já existe.
Os diversos concílios eclesiásticos reconheceram
certos livros como sendo a Palavra de Deus e, com o
passar do tempo, aqueles assim reconhecidos e
profundamente analisados quanto á sua coerência e
autenticidade, foram colecionados para formar o que
hoje chamamos Bíblia.
E que testes foram aplicados o longo dos séculos?
(1) Havia o teste da autoridade do escritor. Em
relação ao Antigo Testamento, isto significava a
autoridade do legislador, ou do profeta, ou do líder
em Israel. No caso do Novo Testamento, o livro deveria
ter sido escrito ou influenciado por um apóstolo para
ser reconhecido. Em outras palavras, deveria ter a
assinatura ou a aprovação de um apóstolo. Pedro, por
exemplo, apoiou a Marcos, e Paulo a Lucas.
(2) Os próprios livros deveriam dar alguma prova
intrínseca de seu caráter peculiar, inspirado e
autorizado por Deus. Seu conteúdo deveria se
demonstrar ao leitor como algo diferente de qualquer
outro livro, por comunicar a revelação de Deus.
(3) O veredito das igrejas quanto à natureza canônica
dos livros era importante. Na verdade, houve uma
surpreendente unanimidade entre as primeiras igrejas
quanto aos livros que mereciam lugar entre os
inspirados. Embora seja fato que alguns livros
bíblicos tenham sido recusados ou questionados por uma
minoria, nenhum livro da Bíblia, cuja autenticidade
tenha sido questionada por um grande número de
igrejas, veio a ser aceito posteriormente como parte
do cânon.
· A Formação do Cânon
O cânon da Escritura estava-se formando, é claro, à
medida que cada livro era escrito, e completou-se
quando o último livro foi terminado. Quando falamos da
"formação" do cânon estamos realmente falando do
reconhecimento dos livros canônicos. Esse processo
levou algum tempo. Alguns estudiosos afirmam que todos
os livros do Antigo Testamento já haviam sido
colecionados e reconhecidos por Esdras, no quinto
século a.C. As referências nos escritos do historiador
Flávio Josefo (95 A.D.) indicam a extensão do cânon do
Antigo Testamento como sendo os 39 livros que
conhecemos e aceitamos hoje.
Quando Jesus acusou os escribas de serem culpados da
morte de todos os profetas que Deus enviara a Israel,
desde Abel até Zacarias (Luc.11:51), Ele, desta forma,
delimitou o que considerava ser a extensão dos livros
canônicos. O relato da morte de Abel está no primeiro
livro, Gênesis; o da morte de Zacarias se acha em II
Crônicas, que é o último livro da disposição da Bíblia
hebraica (em lugar do nosso Malaquias). Assim sendo, é
como se Jesus tivesse dito: "A culpa de vocês está
registrada em toda a Bíblia, de Gênesis a Malaquias".
É interessante que Jesus nunca fez referência a nenhum
dos livros chamados apócrifos, que já existiam em seu
tempo, uma vez que os fatos neles relatados ocorreram
no período intertestamentário, quase 200 anos antes de
Seu nascimento.
O primeiro concílio eclesiástico a reconhecer todos os
27 livros do Novo Testamento foi o Concílio de
Cartago, em 397 A.D. Alguns livros do Novo Testamento,
individualmente, já haviam sido reconhecidos como
canônicos muito antes disso (II Ped. 3:16; I Tim.
5:18), e a maioria deles foi aceita como canônicos no
século posterior ao dos apóstolos, embora alguns como
Hebreus, Tiago, II Pedro, II e III João e Judas
tivessem sido debatidos durante algum tempo. A seleção
do cânon sagrado foi um processo que continuou até que
cada livro provasse o seu valor, passando pelos testes
de canonicidade.
Os 12 livros chamados apócrifos do Antigo Testamento
jamais foram aceitos pelos judeus ou por Jesus. Eles
eram respeitados, mas não foram considerados como
Escritura. Eles chegaram a ser incluídos na tradução
grega chamada Septuaginta, produzida quase 300 anos
antes de Cristo. Jerônimo (420-340 a.C) fez uma
distinção entre esses livros e os canônicos,
chamando-os de eclesiásticos, e essa distinção acabou
por conceder-lhes uma canonicidade secundária. Os
Reformadores também os rejeitaram. Em algumas versões
protestantes dos séculos XVI e XVII, os apócrifos
foram colocados à parte.
· O Texto Bíblico que Conhecemos é Confiável?
Os manuscritos originais do Antigo Testamento e suas
primeiras cópias foram escritos em pergaminho ou
papiro, desde o tempo de Moisés (1450 a.C.) e até o
tempo de Malaquias (400 a.C.). Até a sensacional
descoberta dos Rolos do Mar Morto, em 1947, não
possuíamos cópias do Antigo Testamento anteriores a
895 A.D. A razão disto acontecer era a veneração quase
supersticiosa que os judeus tinham pelo texto, e que
os levava a enterrar as cópias, à medida que ficavam
gastas demais para uso regular.
Na verdade os tradicionalistas, ou massoretas, que
acrescentaram os acentos e transcreveram a vocalização
das palavras entre 600 e 950 A.D., padronizando em
geral o texto do Antigo Testamento, engendraram
maneiras sutis de preservar a exatidão das cópias que
faziam. Verificavam cada págiina cuidadosamente,
contando a letra média de cada página, livro e
divisão. Devemos muito a estes religiosos detalhistas,
em relação à veracidade do que hoje conhecemos. Alguém
disse que qualquer coisa numerável era numerada por
eles.
Quando os Manuscritos do Mar Morto foram descobertos,
trouxeram à luz um texto hebraico datado do segundo
século a.C., com todos os livros do Antigo Testamento,
menos o de Ester. Essa descoberta foi extremamente
importante, pois forneceu um instrumento muito mais
antigo para verificarmos a exatidão do Texto
Massorético, que se mostrou extremamente exato.
Outros instrumentos antigos de verificação do texto
hebraico incluem a Septuaginta, os targuns aramaicos
(paráfrases e citações do Antigo Testamento), citações
em autores cristãos da antiguidade, a tradução latina
de Jerônimo (a Vulgata, 400 A.D.), feita diretamente
do texto hebraico corrente em sua época. Todas essas
fontes nos oferecem dados que asseguram um texto
extremamente exato do Antigo Testamento.
Em relação ao Novo Testamento, mais de 5.000
manuscritos dele existem ainda hoje, o que o torna o
mais bem documentado dos escritos antigos. Além de
existirem muitas cópias do Novo Testamento, muitas
delas pertencem a uma data bem próxima à dos
originais. Há aproximadamente 75 fragmentos de papiro
datados desde 135 A.D., até o oitavo século, possuindo
partes de 25 dos 27 livros do Novo Testamento, num
total de 40% do texto total.
As muitas centenas de cópias feitas em pergaminho
incluem o grande Códice Sinaítico (quarto século), o
Códice Vaticano (também do quarto século) e Códice
Alexandrino (quinto século). Além disso, há cerca de
2.000 lecionários (livretos de uso litúrgico que
contêm porções das Escrituras), mais de 86.000
citações do Novo Testamento nos escritos dos chamados
Pais da Igreja, antigas traduções como a latina ou
Ítala, a siríaca e a egípcia, datadas do terceiro
século, e a versão latina de Jerônimo. Todos esses
dados, mais o trabalho feito pelos estudiosos da
paleografia, arqueologia e crítica textual, nos
asseguram possuirmos um texto exato e fidedigno do
Novo Testamento.
No entanto, o que realmente nos dá a certeza de que a
Bíblia contêm o pensamento inspirado por Deus a homens
escolhidos para esse fim, é o poder que suas verdades
possuem. É impossível ler a Bíblia com sinceridade e
oração sem ser tocado pela força de suas palavras. A
maneira miraculosa como essas verdades atravessaram os
séculos e chegaram até nós, transformando vidas,
modificando costumes, abrandando corações e trazendo
conforto, felicidade e paz de espírito a quem as lê,
nos dão a certeza de que Deus nos fala através de suas
páginas.
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